vassecudiabediaboitesconjuro

caldo verde... oh home forte caldo verde!

Thursday, March 31, 2005

yaaa pute mázómens... fôurasss

xalana0017-4webbb

E eis que do nada irrompe xalana possesso dõdo da cabeça.
Objectivo: não permitir ao rei Eusébio o potentoso tiro a que habituou uma geração que não a minha...
Esta foto capta esse momento raro, uma espécie de manifesto visual contra os dogmas da nossa socidade, um cuspir no chão, um dizer que não...
E como o outro dizia: i´ll do it my way

Tuesday, March 29, 2005

A banda que já era antes de o ser

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Made in China, uma banda séria de carácter performativo, uma banda original irreverente e forinhas, mais uma, mas diferente.
A sua música é, apesar da incidência do alcool, lúcida e emotiva, crua e frontal, ainda que respingada por vezes pelo desespero e a paranoia. Tudo conflui numa exacerbação de sentimentos e pulsões difíceis de controlar que se exteriorizam em olhares ressabiados, piropos do arco da velha e outras rebarbadices.
Os Made in China são a saida de emergência de um autocarro descontrolado, o ar condicionado numa casa de alterne, as lâmpadas num candeeiro de cristal, a aureóla de um mamilo proeminente, o crémaster de um caralho inclinado á esquerda, a linha da vida ma mão de uma criança, uma lente excillor anti-riscos e anti-reflexo, o que se vê é o que se tem.
Os Made in China oferecem momentos de alegria e boa disposição, um verdadeiro actimel musical, recheado de L-caseis imunitases.
Aconselha-se a compra do albúm para ingestão diária, seus ouvidos rejubilarão de satisfação.

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Aqui está um possível quarteto para o Made in China.

Tuesday, March 22, 2005

clorofila y, curta-metragem


Clorofila Y

O movie é todo a preto e branco e passa-se numa ilha deserta (vulcão dos capelinhos)

1ª parte, o executivo
Um executivo de fato e gravata, de óculos de sol, com a cara bué branca como que pintada de protector solar, encontra-se no meio do deserto apoiado no cabo de uma pá, a fixar o horizonte como que hipnotizado.
Desperta do transe e tira do bolso um mapa (o cameraman põe o mapa em 1º plano: trata-se de um mapa de uma ilha deserta pequena com um X no meio). O executivo olha para baixo, desenha um X com a pá na areia e começa a cavar. Este man tem alguns tiques esquisitos (trabalho de personagem). O cameraman alterna entre 2 planos: o executivo a cavar, e a sombra dele enquanto cava e a areia atirada para o lado. Passado um bocado desenterra uma mala de executivo. Senta-se e abre a mala (contém uma foto, um charuto, uma rosa, óculos de mergulho, respirador, barbatanas e braçadeiras), pega no charuto e acende-o. Depois pega na foto e fica a mirá-la durante um bocado; coloca-a sobre a areia com a rosa por cima e fica a mirar o mar enquanto fuma. Depois o cameraman mete a foto em grande plano: é uma polaroid de um peluche com o nome por baixo (Pópi). Volta ao plano do executivo a fumar e a mirar o mar.

2ª parte, o John Doe meio à deriva meio à procura
Entretanto dá-se uma prolepse, isto é, o tempo anda para a frente sem que o espectador tenha noção. Surge o John Doe em cena. Este man é um náufrago de aspecto crazy que foi parar a esta ilha deserta; anda pelo deserto com uma toalha de banho pequena enrolada à cintura, barba e cabelo grandes, com a zona à volta da boca completamente borrada de verde, com umas pantufas maradas (daquelas com forma de animal), com uma bíblia na mão esquerda e uma trela de cão na mão direita, que é arrastada pela areia sem nada na extremidade. Procura qualquer coisa. Após andar um bocado à deriva abre a bíblia numa página e lê um parágrafo fixe (à laia de filme mudo ele pode dizer caralhadas e a frase surge num plano preto à parte: Matias; versículo 5.4 E saberás encontrar o teu rumo pelas indicações do grande profeta.); fecha a bíblia, olha o horizonte e faz o gesto internacional de quem confirma e diz que sim com a cabeça. Anda mais um pouco até encontrar um profeta sentado numa cadeira no meio do deserto com um sorriso bué estúpido de orelha a orelha, a fazer tricôt, com uma faca espetada na cabeça (com ketchup), a baloiçar o tronco ‘pá frente e ‘pa trás, e com uma tabuleta aos pés a dizer “profeta”. O John Doe fala (como num filme mudo a frase surge num plano preto): Oh grande profeta da pequena ilha deserta, diz-me onde está quem levou o meu Pópi pois sem ele não sobreviverei nem mais um dia. E o profeta agarra as agulhas do tricôt com força e como que numa sessão paranormal aponta para a frente onde estão umas pegadas de barbatanas. O profeta cai no chão deitado e grita “salva o Pópi pois ele corre grande perigo!”. O John Doe agradece ao profeta e segue as marcas de barbatanas. Pára momentaneamente e baixa-se para pegar numa mão cheia de areia da pegada, cheira-a e olha em frente.

3ª parte, um fightezinho
Mais à frente espreita por cima de um calhau e vê o executivo equipado com óculos de mergulho, respirador, barbatanas e braçadeiras a preparar-se para entrar na água (no porto do comprido) com o peluche debaixo do braço, e com os seus tiques esquisitos. O John Doe começa a correr contra o executivo e a gritar (plano negro: Ahhhhhh Ahhhhh Ahhhhh Ahhhh). O John Doe atira-se ao executivo e ambos caiem na água. Sobem ao porto e lutam um com o outro enquanto o peluche sentado no chão observa atento à luta. O cameraman alterna entre 3 planos: os 2 a lutar, o peluche a olhar para eles e a sombra dos 2 a lutar. O John Doe usa a bíblia para bater no alien e acaba por matá-lo literalmente deste modo. O alien esvai-se em sangue verde e o John Doe fala (plano negro: Hasta la vista Bambi!) O John Doe olha o alien, olha a bíblia e beija-a; depois olha para cima e fala, plano negro: Simão; versículo 3.11 A palavra de Deus é mais poderosa que qualquer arma de guerra. Pouco depois o alien desaparece repentinamente deixando apenas uma grande marca de sangue verde derramado no chão.

4ª parte, the fim
De seguida o John Doe agarra o peluche fazendo-lhe festas, prende-o à trela e segue caminho para o deserto, a correr, a saltar, a rebolar na areia, a pinchar e a brincar com o peluche.
Passa pela zona que tem uma pá, uma mala aberta, uma ponta de charuto e uma foto na areia com uma rosa por cima. Senta-se, pega na rosa e cheira-a; pega a foto e olha-a. Tem uma reacção bué burlesca ao ver a foto e mostra-a ao peluche. Depois coloca a ponta de charuto na boca e fixa o mar, enquanto faz festinhas ao peluche. The fim.

Sonoro: large number (#2,3,4,7); skalpel (#3); throbbing gristle (#2)

FF

once upon a time...

“formigas no palato” produções 2003 apresenta:


Once upon a time...ou como o Jeremias deixou as batatas e foi conhecer o Mundo

com o patrocínio da rota do badalo fresco


1º capítulo:
A infância de Jeremias


«Quando se faz chichi na cama, a princípio fica quente,
mas depois arrefece.»
James Joyce


(Geruvaldo, avô paterno de Jeremias)
Crescendo mais que o tecto da própria casa
Geruvaldo ganhou o péssimo hábito de dobrar as costas
para evitar bater com a cabeça no mesmo.
Geruvaldo, homem visionário de espírito aberto,
sempre sonhara ter uma casa maior, mais confortável e sofisticada,
mas com o passar dos anos e restringido nos movimentos
nunca se mexeu o suficiente para alterar tão triste sina.
Até que um dia Geruvaldo, ocupado nas suas lidas domésticas,
encontrou um espelho antigo cheio de pó.
Limpou-o e para seu desespero
deparou-se com um homem corcunda e débil, muito diferente daquele
que ainda julgava ser.
E então aí nem a baba nem o ranho o ajudaram a sair
de tão frustrante situação.
Se ao menos tivesse saído à rua
em vez de sonhar com uma casa maior
Geruvaldo ter-se-ia apercebido de que lá até poderia saltar!


(Jeremias brinca aos legos)
Uma peça aqui, outra ali e no final:
um iate topo de gama pr’a bazar ‘pó Pacífico.


«Se a vida tà sinzenta arranja lapiz de cor.» Jeremias aos 7 anos



Esteveraldo, pai biológico de Jeremias,
apreciava passar as tardes dos domingos
a pescar e a ouvir um bom relato de futebol na rádio
acompanhado por Cidalinopliteia, a sua boneca insuflável.
Certo dia mais ventoso que o costume,
Cidalinopliteia caiu ao mar levada por uma aragem.
Esteveraldo mergulhou no seu resgate e foi comido por um tubaralho.


(o recreio)
Os putos todos saltam, riem, choram, correm, gritam!
Tralhos sensacionais, joelhos esfolados, narizes e dentes partidos,
cabeçadas fabulásticas nos baloiços, «dá cá essa bola q’é minha!», ranho a saltar do nariz,
baba e terra na boca, «não é nada, é minha!»
E saltam, e riem, e choram, e correm, e gritam!
Merda fora da sanita, tudo cheira a mijo, as profs a pegarem de cabeça e ZÁS!
Toma lá um chapadão no focinho p’aprenderes a ‘tar quieto!

(e saltam, e riem...)



(TPC)
"Se eu fosse um cromossoma 24 e a Terra fosse cúbica e dominada por barbies terroristas anti-pipocas gostava de:"
cunhesser o mundu


«A gueravidade só nos prende o corpo á Terra.» Jeremias aos 11 anos.


(o padrasto)
João Jorge Baptistóide,
mais conhecido na aldeia por Jojó,
era um homem pacato e reservado
e era frequentemente assediado na rua
por alguns indivíduos de carácter mais duvidoso,
que lhe proferiam frases ofensivas do tipo
“oh Jojó, faz-me um bobó!”
E mesmo embora lhe apetecesse muitas vezes
responder na mesma moeda,
Jojó continha-se de acordo com os seus padrões morais e católicos.
Um dia foi apanhado a roubar laranjas e morreu com um tiro de cartucheira.


(Jeremias brinca aos legos, 2ª pt.)
Mais duas peças acolá, outras três ali e voilá!
Um foguetão vermelho pr’a bazar ‘pá lua.


«Á putos muinta estupidos.» Jeremias aos 13 anos

(a mãe)
Já reformada, Dona Gertrudes Jovenaldina tinha o hábito
de acordar com as galinhas, ainda antes do sol nascer.
Tomava um pequeno almoço bem favorecido e pormenores como
uma colher e meia de açúcar amarelo na sua tigela de cereais muesli
com leite rico em cálcio jamais eram esquecidos.
Depois de vista a sua telenovela matinal Dona Jovenaldina
ia para o quintal onde passava largas horas a regar as suas
camélias e a conversar com elas.
«Sabiam que o vizinho de baixo e a professora da primária andam a...»
Um dia molhou os pés e morreu de uma paragem de digestão.



2º capítulo:
A hora de Jeremias


Num gesto demorado
Jeremias recolheu o sacho,
limpou o suor da testa e olhou o sol por um momento
na tentativa de adivinhar que horas seriam.
As poucas nuvens no céu permitiam analisar com clareza
a posição do sol. Era fácil.
Olhou de novo a terra e fixou as batatas como nunca o fizera antes.
Foi então, num momento de distracção superior,
que Jeremias deixou fugir da boca uma frase que nunca mais o deixaria igual.
“São horas de conhecer o Mundo!”

Jeremias faz as malas e segue viagem.



3º capítulo:
Jeremias vai ao Oráculo


«Esta merda é maior do que eu pençava.» Jeremias, ao fim de duas horas de viagem.


(o Oráculo)
Uma vez iniciada a sua grande viagem Jeremias sentiu-se um pouco perdido o que não é mais do que natural se for tomado em conta tratar-se da primeira vez que Jeremias saía da aldeia. Tomou então a decisão de passar no Oráculo a fim de esclarecer as suas ideias. Chegado ao Oráculo Jeremias, um pouco ansioso, olhou em volta procurando alguém com quem falar, alguém que o pudesse orientar e elucidá-lo do seu verdadeiro propósito neste mundo. Uma pergunta simples, pensou. Porém não seria uma resposta simples a vir ao seu encontro. Após uma longa espera, Jeremias perdeu o receio e gritou para as paredes: “Quem sou eu!? Que faço aqui!?”
As paredes sacudiram, como se tentassem rir. Jeremias sentiu-se incomodado mas não desanimou. “Qual é o meu destino!?” Foi então que numa parede começaram a manifestar-se fenómenos estranhos. Sacudiu ao início e de seguida mudou de cor. Esbranquiçou. Nela começaram a ser projectadas imagens vindas não se sabe de onde. Ao início difusas e desfocadas, mas pouco a pouco foram ficando mais nítidas. Eram imagens antigas, provavelmente de um noticiário. Ouvia-se uma reportagem: «A hipótese de que a pop poderá vir a destronar o MIR, Movimento Intelectual Renovador, é uma previsão mal recebida no panorama meteorológico global. Porém, foram encontrados em escavações recentes na Antárctida fósseis de camelos de cinco bossas que, após longas semanas de investigações, provaram o triunfo eminente da pop com alguma brevidade pela mão de Jeremias, o profeta da pop que há-de vir ao Mundo. Os líderes políticos das principais potências mundiais já vieram a público tentar acalmar as populações e afirmar que serão usados todos os esforços possíveis para combater as histórias da Carochinha e dos super-heróis de fatiotas ridículas; reforçam a importância desta luta ao afirmarem:
“Venha ao Mundo quando vier Jeremias, esse tal profetazinho de que tanto falam, será sepultado no cemitério dos traidores do MIR ao lado da campa da pop.”»
Jeremias ficou estático. Boquiaberto. Após uma longa análise mental ao vídeo que acabara de ver meteu as mãos à cabeça e gritou com toda aforça dos seus pulmões, “EUREKA!!!”
Jeremias sentia-se como se dos seus ombros tivessem tirado uma baleia azul. Pelo menos uma baleia azul bebé, acrescentou à sua linha de raciocínio. Bem, talvez um golfinho, corrigiu, ou um atum. Mas dos grandes. Mas que interessava o tamanho do bicho afinal? Sentia-se tão feliz por finalmente saber quem era e conhecer o seu verdadeiro propósito neste planeta que decidiu reiniciar de imediato a viagem, cheio de entusiasmo, desta vez com o objectivo claro de espalhar a verdade da pop.



4º capítulo:
Jeremias, o profeta, vai à floresta



Pela noite, já Jeremias havia conseguido reunir
bastantes animais da floresta à volta de uma fogueira
que ateara com pequenos ramos secos,
e numa longa conversa instruiu-os para que pudessem
compreender a doutrina e ajudá-lo nessa grande tarefa
que era a de espalhar a verdade da pop.
Do lobo mau ao javali, dos veados às raposas
do pardal ao colibri, e mesmo aos mais pequenos,
formigas, abelhas, mosquitos entre tantos,
todos escutavam atentos as palavras sábias de Jeremias.
O triunfo da pop era uma convicção de todos quantos
testemunharam tamanha celebração da pop
e Jeremias aproveitou a ocasião para fundar
a Frente de Libertação da Pop,
a FLP.
Em apo(p)teose Jeremias, o profeta,
era nomeado Senhor da floresta.



(o lobo mau, braço direito de Jeremiasna liderança da FLP)
À hora do chá
o lobo mau uivou alto do cimo da colina
para que os três porquinhos e todos os
capuchinhos vermelhos da floresta o ouvissem:
«Camaradas, eu tive um sonho!
Um sonho grande, um prenúncio de um mundo melhor
que precisa ser partilhado com todos.
Sonhei que o mundo era perfeito e todos os que nele
viviam eram felizes. Um mundo pop
recheado de arco-íris lilases no horizonte,
pais natal hippies no poder político,
telenovelas árabes em horário nobre,
vibradores gigantes flutuando nos céus como nuvens,
super-heróis domésticos controlados à distância,
e cowboys cor de rosa nas montras das lojas!
Um mundo onde a justiça e o entretenimento rápido são
máximas do povo, e onde todos estão mais
protegidos dos pacotes de leite transgénico e
da conspiração da caça ao lobo.
Camaradas, eu tive um sonho.»


«Desculpa, eram as ormonas a pençar alto.» Jeremias aos 25 anos


(capuchinho vermelho, simpatizante do MIR)
E lá ia a menina do capuchinho vermelho
com a sua cesta bordeaux na mão esquerda
apanhando cogumelos aqui e ali
pela floresta fora,
a caminho de casa da sua querida avózinha.
Na cesta levava ainda um frasco de compota,
rebuçados mentol e um bule com o chá preferido da avó.
Fazia este percurso todos os fins-de-semana
depois de sair da faculdade,
sempre com um grande sorriso rasgado na cara.
Hoje, porém, fazia-o triste. No dia anterior vira num canal televisivo,
ao que parece muito popular no seio do MIR,
que um dia o sol iria explodir
e destruir o planeta Terra bem como todos os
outros corpos celestes do sistema solar.
(BUUUUUUUUMMMMM!!!!!
Vai mas é apanhar cogumelos venenosos e come-os!!!
AHaHAhaHaAhAHa!
E COME-OS!!!!! E COME-OS!!!!!
BUUUUUUUUMMMMM!!!!!)
E isto deixava-a muito preocupada.



5º capítulo:
Jeremias, o profeta, vai ao deserto



(o tio)
Manuel Joaquim,
mais conhecido por Manú, o cowboy do meio dia,
dominava o calibre como ninguém
e era muitas vezes comparado a Lucky Luke
o qual, diziam, não passar de um docinho ao seu lado.
Amigo do seu amigo,
tinha por hábito ir à tasca pela manhã emborcar bagaços
e contar as suas aventuras de quando era Senhor do Texas.
Ele e Harley, o seu cavalo fiel, travavam confrontos épicos
e duelos inimagináveis nas paisagens mais
desérticas do Oeste. Era confidente dos abutres e dos cactos
com os quais partilhava muitos finais de tarde calorosos
a contemplar o pôr do sol e a fumar do cachimbo da paz.
Amigos do peito, acrescentava.
«Hasta la vista Bambi!» era a última frase que os seus inimigos ouviam
antes de irem prestar contas a Satanás debaixo da Terra.
Um dia, mais alucinado que o normal, pôs-se no meio da estrada
imaginando combater os índios Apaches
e morreu atropelado.


«Se tudo o que vem á rede é peiche vai lá fud** carapaus!» Jeremias aos 29 anos



Nem só de cactos vive um sapo
objectou Jeremias, bastante desidratado,
constatando que o dia anterior passara depressa.
Aliás, ultimamente,
todos os dias passavam depressa
na terra das 1001 desculpas para apanhar sol.
”Lucidez, não bazes my love” – pensava
Jeremias para os seus botões.



(o meio irmão de Jeremias,
representante da FLP em África)
Era nos dias de maior calor
que John Fagundes,
imigrante clandestino no Zimbabwe,
se sentava no banco da varanda e ressonava alto
sonhando com algodão doce e coelhinhas da Playboy.
Um dia engasgou-se na baba e morreu asfixiado.


«Merda! Não se paça nada aqui...» Jeremias, saindo do deserto.



6º capítulo:
Jeremias, o profeta, vai ao Pólo Norte



(Branca de Neve e os 7 anões,
representantes do MIR no Pólo Norte)
Ao pressentir uma abstracção perturbante
Branca de Neve perguntou num tom cáustico
a fim de quebrar o gelo:
«Que se passa profeta,
andas a voar até onde as asas não aguentam!?»
Jeremias palitou do canino direito um pedaço de carne,
mastigou-o de novo e retorquiu em jeito de comentário,
fazendo denotar uma enorme indiferença:
«Não te iludas fofa... adoro vertigens!»



Entretanto, não muito longe dali,
o pai natal colocava o saco das prendas no trenó,
dava um torrão de açúcar a cada uma das renas e seguia viagem.
O percurso era tempestuoso e difícil mas o sacrifício era
recompensado pelas expressões mágicas das crianças
na manhã seguinte, ao abrirem as prendas.
“Oh! Oh! Oh! FODA-SE! OH!” – gritava histérico,
por cada lareira acesa que encontrasse.


«Merda! Tambèm não se paça nada aqui...»
Jeremias, saindo do Pólo Norte.



7º capítulo:
Jeremias, o profeta, vai a Hollywood e salva a pop



Chegado a Hollywood Jeremias, mais lúcido do que nunca,
não se acanhou com o poder das lights, das palmeiras,
do fast food desmedido, dos carros desportivos, do living la vida louca,
dos “I love you” como quem come batata frita,
dos sorrisos artificiais nem com os implantes de silicone.
Jeremias apalpou o terreno pelas partes e logo pôs em marcha o seu plano astucioso
fazendo uso da sua fantástica retórica.
Não levou muito tempo a formar a Associação Underground
de Apoio à FLP, a AUAFLP,
muito à custa de uma fortíssima adesão de actores frustrados,
facilmente influenciados pelo grande carisma do profeta.
Esta associação prosperou de tal modo na cidade
que já era difícil controlar os comentários da imprensa,
há algum tempo no rasto dos acontecimentos.
Entre os nomes mais mencionados pela comunicação social
encontrava-se um que iria aparecer nos livros de história
do ensino escolar por muito tempo. Tratava-se de Josefeida Antonieta,
braço esquerdo de Jeremias na liderança da FLP.



Um registo raro de Agostinho, o neurónio fugitivo
(Conta-se ainda por aí que Agostinho ambicionava tornar-se um actor consagrado de filmes intelectuais mas, ao que parece, terá chumbado a todos os castings a que se propôs acabando por perder o seu rumo dentro do MIR. Como consequência disso ter-lhe-á sido declarada insanidade mental e respectivo aprisionamento num hospício local muito conceituado.
E foi então que Agostinho fugiu à procura de melhores sinapses e aderiu à AUAFLP,
sendo um dos militantes que mais contribuiu para o triunfo da pop.)



(a entrevista)
Munida de uma mini-saia justa verde alface
e de um decote perigosérrimo
Josefeida Antonieta cruzou as pernas,
piscou um olho e fez beicinho.
Warhol, mestre da pop, diria um dia mais tarde
“Que belos lábios carnudos!”
Escusado será dizer que Josefeida
conseguiu o papel,
consumando o triunfo da pop nos estúdios de Hollywood.



Jeremias, o profeta, sentia-se como o Senhor do mundo
quando já acomodado no seu Hotel particular de seis estrelas
mandou mudar o nome da cidade de Hollywood
para Popland, a nova capital do seu império.
Ordenou ainda que retirassem do cimo da colina
as letras de HOLLYWOOD,
visíveis a muitos quilómetros de distância,
para no seu lugar colocarem:
JEREMIAS, THE LORD OF POPLAND,
um tributo digno reconhecido à sua pessoa.



(Discurso de Jeremias em directo dos estúdios de Hollywood)
Isto ‘tá ligado? Liguem lá essa merda!
Ahn? Vai, segue, segue, foda-se...
Mundo!Estou hoje aqui, eu, Jeremias, o vosso líder,
para vos dar a conhecer a Nova que há muito esperávamos:
a FLP controla agora todos os meios de comunicação à
face da Terra, o instrumento de maior poder do extinto MIR.
A pop é grande e doravante irá dominar todo
o globo terrestre! Mantenham os vossos
órgãos sensoriais bem abertos e deixem-se levar por ela
que ela saber-vos-á conduzir por esse caminho fabulástico
que é o caminho da pop.
E toda a gente cantará o nosso hino, todos os dias,
ao acordar e ao deitar, para bem da nação:
”a pop é grande e por ela cantarei!
salvé! jeremias, o profeta! salvé!
a pop é grande e por ela morrerei!
salvé! jeremias, o NOSSO líder! salvé!

ERA UMA VEZ O MIR, PUFF! ONDE É QUE ELE ‘TÁ AGORA?!
VIVA O ENTRETENIMENTO rápido, VIVA! VIVA!
A POP VEIO P’RA FICAR, APESAR DA DEMORA!
VIVA O ENTRETENIMENTO PURO E DURO, VIVA!
a pop é grande e por ela cantarei!
salvé! jeremias, o profeta! salvé!
a pop é grande e por ela morrerei!
salvé! jeremias, o NOSSO líder! salvé!”


E todos os que sobreviveram nesta história viveram pop para sempre.

FF

para além do espaço

“formigas no palato” produções 2004


1ª parte


10... 9... 8... 7... 6... 5... 4... 3... 2... 1... IGNIÇÃO!



O poder de descolagem era esmagador. Fazia-nos sentir os olhos enterrarem-se na nossa consciência e os órgãos comprimirem-se contra a parede das nossas costas. Perante tamanho poder de propulsão era-nos quase impossível sequer olhar aos lados para ver as labaredas que rodeavam a nave e as expressões violentas dos colegas de bordo. Não era um retrato vulgar que se esquecesse facilmente. De todo.




Houston 3.11, encontramo-nos fora da órbita da Terra. A fase de descolagem foi concluída com sucesso. Abram o champanhe por nós.



A processar informação...


A nossa equipe era liderada por Casimiro, um comandante experiente habituado a este tipo de cargo. Este senhor de olhar profundo e busto imponente era um veterano de guerra que perdera um pé e dois dedos ao serviço da pátria. Mesmo a gravidade zero usava sempre uma bengala negra de pega prateada com a qual martelava o chão e as paredes constantemente. E dizia com o seu jeito peculiar de falar por entre os dentes cerrados tal qual um ventríloquo, ser capaz de concretizar as suas missões mais delicadas de olhos vendados. Bastava querer.
A sua confiança impunha respeito e todos nós sentíamos o desejo de dar o nosso melhor ao seu serviço.


A inteligência artificial dos computadores a bordo era extraordinária e quando posta à prova, fosse em jogos de xadrez, fosse em avaliações astronómicas ou tarefas de precisão mais apurada, mostrava-se sempre competente e eficaz.



Da lua a Saturno é um passinho, dizia Casimiro muito convicto da sua calculadora electrónica ao somar e subtrair algarismos. Fazia-o com destreza e devo dizer que todos nós, naquele dia, acreditámos nele.
28375 + 78325 + 1562 – 942 = X
Quarenta dias de viagem, há provisões que cheguem para todos e combustível ao pontapé. Não há que enganar. E nós acreditámos.


Ao viajar no espaço, a gravidade zero proporcionava-nos movimentos fluidos e serenos, livres de tensões. Tal liberdade dava-nos uma flexibilidade motora e espacial extraordinárias o que nos fazia fortalecer a nossa própria flexibilidade mental.



Casimiro era um homem de poucas palavras. Porém quando falava todos se calavam para o escutar. Suas palavras eram incisivas e estimulantes.
Como vedes a lua a esta distância não mede mais que um palmo de diâmetro.
E nós, efusivos, amontoávamo-nos à janela para observá-la.



2ª parte



Aquilo que mais sentia falta era de ter os pés assentes no chão. Um chão estável e previsível. Um chão verdadeiro.



O silêncio, inicialmente monótono, foi ganhando o seu próprio espaço na viagem, até que cansados de se ouvirem a si próprios os nossos pensamentos refrearam a sua voracidade habitual e deixaram as nossas mentes calmas e serenas. Assim, quando nos tempos livres ouvíamos música, normalmente clássica, era como se usássemos o sentido da audição pela primeira vez, e toda a melodia da música atingia-nos de um modo por demais físico.


1 = 0 + 1


(Beethoven)
Da Terra apenas trouxera alguma música, muitos livros e um peixe num pequeno aquário, o Beethoven. Dera-lhe esse nome pela vivacidade que ganhava perante a música do compositor. O aquário de Beethoven era apropriado à gravidade zero: todo fechado excepto em dois orifícios munidos de duas pequenas válvulas. Uma que fazia a circulação de oxigénio e outra pela qual o alimento lhe era fornecido. Como o aquário não estava completamente cheio, a água produzia um efeito visual deveras peculiar, e não raras vezes dava por mim a fixá-lo, abstraído e a divagar. «A leveza da água, como um pensamento sem peso, mas materializado.»
Depois, despertava do transe.


(ainda a respeito de Beethoven)
Havia outra razão que me fazia divagar ao fixar o aquário de Beethoven. Aquele pequeno peixe, enfiado num pequeno aquário, com todo aquele ambiente flutuante em seu redor, reflectia um pouco o que eu sentia. Afinal de contas a principal diferença entre mim e ele era a de que o meu aquário era ligeiramente maior. E todas aquelas estrelas perdidas na distância do espaço e do tempo, pareciam elas fixar-me também e divagar em toda a sua dimensão. E como deviam ser grandes.


Recolher o maior número possível de amostras para respectiva análise.


Alguns meses após o início da viagem já nos era difícil recordar o tempo anterior à missão, como se sempre tivéssemos vivido a bordo da nave e qualquer outro tipo de vida ou rotina nos fosse alheia. A nossa ligação à nave era de tal modo intrínseca que a fronteira entre ela e a tripulação não era de todo perceptível.


Era capaz de passar horas a fio a fixar a parede bege do meu compartimento.



3ª parte


Fenómeno estranho detectado a 72 horas em rota de colisão.


Sempre havia aprendido e estudado a natureza dos buracos negros mas nada me preparara para tamanho panorama. Era como se tudo o que imaginara fosse agora multiplicado por mil.


(...) Algo de muito grande, demasiado grande para compreendermos estava a acontecer connosco. A única certeza que tinha, que me enchia de uma estranha melancolia, era de que nada voltaria a ser como dantes.


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(o relatório)
Temperatura interior, 25ºC.
Homeostase, estabilizada.
Sistemas informáticos, operacionais.
Tripulação, activa.
Combustível, a três quartos.
Nenhum padrão estrelar reconhecido.
Localização, desconhecida.
Data, incerta.
Rumo, desconhecido.



Um pequeno botão pressionado e uma função prontamente obedecida pelo computador de serviço. Três incógnitas na equação não são problema, mas à distância que estamos da próxima estrela qualquer tipo de cálculo é supérfluo.
X + Y – 7513 = Z + 15

A processar nova informação...



Por vezes dava por mim a falar sozinho.
Amanhã será passado, e todo o passado já esteve presente. Mas o presente foge-me a todo o instante. Não te lembras?
Frases desconexas, sem sentido. Tinha percepção de que estas frases me saiam pela boca, mas sobre elas não tinha qualquer autoridade.
Talvez se me transcendesse a calor e em ebulição me sentisse o pensamento fluir para o cosmos.
E mesmo assim, a estranheza de tão invulgar comportamento não provocava em mim qualquer sinal de perturbação.
Nada.



Sinto que qualquer coisa está a crescer dentro da nave e dentro de mim. Algo maligno está a tomar conta do meu corpo e dos meus pensamentos. Como raízes obscuras enterrando-se no solo, infectando-o lentamente. A todo o instante, estas imagens fragmentadas que me violam a retina, de sangue a escorrer das paredes, as paredes a contorcerem-se. Os outros fazem-se despercebidos para eu pensar que estou a ficar louco. Mas são maus actores. Dá vontade de rir. E rir e rir até esquecer a razão de tudo.
Os gritos das paredes são subtis, mas incapazes de deixar o mais gélido humano indiferente. E eles fingem ignorar a inquietude do vermelho, das paredes a sangrarem, daquele cenário aterrorizador a escorrer para as nossas cabeças. Mas eu consigo brincar ao joguinho deles. É fácil, basta fazer de conta.
Que péssimos actores.



(Instruções da caixinha de música)
Dar à manivela no sentido dos ponteiros do relógio e descontrair ao som da melodia.
Sugestão: apreciar a música com um bom cocktail tropical de frutos exóticos, com duas pedras de gelo, com uma foto de uma praia do Pacífico à sua frente.



Ontem vi um bando de pássaros a voar ao lado da janela do meu compartimento. Pareciam gaivotas. Gaivotas famintas. Eu sei porque voavam junto à nave. Estes bichos têm um sentido de olfacto apuradíssimo, sei que farejaram o Beethoven. Só podem. Mas não te preocupes peixinho. Não te preocupes que o papá está preparado para o que der e vier. Se a coisa correr pró torto o papá tem um frasco de insecticida no bolso capaz de dar conta do recado.
Deixa-os vir.




(Justina)
Justina é um dos tripulantes novos que apareceu após o acidente. Eu sei isto e ela também o sabe. Também sei que ela é ignorada pelos outros, e que tende a aproximar-se mais a mim pela atenção que lhe dou. À primeira vista Justina parece uma rapariga inocente, incapaz de fazer mal a um insecto. Uma verdadeira miss. Mas mesmo que os seus olhos ingénuos consigam disfarçar a demência dos seus pensamentos, eu bem sei que as suas palavras são mais corrosivas que o el ácido sulfúrico, e que os seus actos camuflados carregam a violência de seus delírios.
E como os seus olhos ingénuos parecem brilhar quando se aproxima de mim e me segreda ao ouvido,
vamos fazer coisas perversas... hmmm... perversas...



«Presta atenção, é aqui que entra o contrabaixo!», repetia Beethoven fervorosamente.



Os outros andam a conspirar contra mim. Eu sei que sim. Fazem planos de me fechar no quarto amarelo. Querem que vá fazer companhia a Casimiro. Fazem de conta que o acidente nunca aconteceu e dizem que este tempo todo fora da Terra me deu a volta à carola. Que tenho a imaginação fértil para este género de histórias da Carochinha voadora. Dizem que estamos a quinze dias da Terra e que toda a nossa missão foi um êxito. Incrível a facilidade que esta gente tem em mentir. É de morrer a rir devagarinho. Se em vez de um insecticida no bolso tivesse uma moto-serra mostrava-lhes a insanidade toda.



Ser caçado como um animal selvagem faz-nos expor instintos de que nós próprios desconhecemos. A adrenalina possui-nos o corpo deixando a nossa mente com um papel secundário. O coração salta-nos à boca seca e a ansiedade torna-se destrutiva. Nunca os delírios de Justina me estiveram tão presentes. Depois, uma picada na perna esquerda. O coração abranda, a ansiedade esvai-se. E a sensação dos sentidos a desvanecerem. Os sons distantes, a visão deturpada, o tacto anestesiado, como num sonho.


No quarto amarelo, eu, Casimiro e Justina parecemos três zombies, completamente dominados pelas drogas que os outros nos dão. Até o Beethoven está mais apático. Agora querem-nos fazer crer que está tudo bem, que já chegámos a Terra e que nos encontramos numa clínica psiquiátrica qualquer de recuperação. Que tudo vai correr bem. Eu bem sei que tudo isso é mentira porque aos meus olhos a água do aquário de Beethoven nunca parou de flutuar. Não me venham com blá blázinhos de merda.


Entretanto os outros levaram Casimiro e Justina do quarto, embrulhados em grandes sacos negros. Também levaram o Beethoven, deixando-me completamente só. Eu sei porque os levaram a todos. As provisões da viagem começavam a escassear e com isso a fome havia levado as suas mentes doentias a recorrer ao canibalismo. E eu era a próxima presa.


(a ementa)
A ementa para o jantar desta noite é peixe grelhado para abrir a refeição e como segundo prato temos a especialidade da casa, sugestão do Chefe, bifinhos de carne humana com cogumelos, temperados com sangue fresco. Para sobremesa temos miolos doces com molho de esperma, receita da avózinha.
Bon appétit dementes.


E nisto a cabeleira do maestro caiu ao chão de tanta convulsão exibindo a sua cabeça calva. Hipnotizado, o maestro continuou a articular a sinfonia com toda a destreza.



Já era normal ter vários pesadelos à noite. Um efeito secundário daquelas drogas fortes, calculava. Às vezes até os tinha acordado. E como pareciam reais.
No meio destas manifestações de terror havia um pesadelo em particular que me deixava bastante perturbado. Tinha-o quase todas as noites antes de acordar aos gritos, agarrado aos braços. O aquário de Beethoven caia no chão desfazendo-se em estilhaços. Beethoven contorcia-se em espasmos no chão. Eu, em pânico, via-o morrer asfixiado. Depois pegava num bocado de vidro partido e começava a rasgar a carne dos meus braços.



Rumo, desconhecido.


FF

a lupa

“formigas no palato” produções 2004


lupa, s. f. de lupis lt. Instrumento óptico capaz de aumentar o tamanho das coisas sem no entanto lhes alterar de facto o tamanho.



(a lupa, I)
A lupa é uma coisa boa para ver pormenores.
As antenas das formigas são um pormenor e com a lupa
consegue-se ver o quanto podem ser grandes.
Eu penso que as antenas das formigas são muito importantes porque
captam a maior parte dos seus estímulos.
Como quando vão a correr depressa e chocam de frente
umas nas outras mas não se magoam.
Um grão de areia também é um pormenor. Mas o poder da
lupa fá-lo quase transformar-se num asteróide.
E às vezes até penso que um asteróide a colidir com outro faz uma
grande explosão, desfazendo-se em bocados mais pequenos.
Porque lhes faltam antenas para receberem estímulos.
Como as formigas.


(a lupa, II)
Com a lupa também consigo ver ao pormenor os grãos-de-pólen
que por aí andam a voar e nos fazem espirrar na Primavera.
Voam no ar como os pássaros e o super-homem. Mas não têm
asas nem a super capa. Por isso, acabam por ser como os asteróides
que também não têm asas nem super capa mas voam na mesma.


(a lupa, III)
Os cientistas também usam as lupas no laboratório
para verem os micróbios que são invisíveis a olho nu.
Os micróbios são bichos ainda mais pequenos que as antenas das formigas
e andam por todo o lado, mesmo na nossa comida e no nosso corpo.
Outra função da lupa é de evitar que as pessoas digam que estão a ver
micróbios onde eles não estão. Como quando dizem
“Olha! ‘Tá aqui um grande ao pé de mim! Não é fantástico?!”.
Assim a lupa vai lá e diz se é ou não é um micróbio que está ao pé da pessoa.
E muitas vezes a lupa vai lá e diz sem rodeios,
“não há cá micróbio algum.”
Muitas pessoas não gostam da lupa por isso.


(a lupa, IV)
A lupa para além de ver a erva e os insectos mais ao pormenor
também pode ser usada para aquecer coisas. Como quando fazemos
a luz do sol incidir sobre qualquer coisa através da lupa e
essa coisa aquece. E às vezes até queima.
Por exemplo, mesmo no Inverno se incidirmos a luz do sol
num formigueiro é como se as formigas voltassem a estar no Verão,
e fossem depressa buscar biquinis e calções aos sótãos das suas
casas para se deitarem debaixo da luz a trabalhar ‘pó bronze.
E depois é vê-las apanharem grandes escaldões e ficarem vermelhas
como pimentões vermelhos. Por isso eu penso que é preciso ter
algum cuidado a manusear a lupa. Porque quando a luz é muito forte
podem-se queimar coisas.



(vitaminas)
As vitaminas são ainda mais pequenas que os micróbios
e fazem-nos bem à saúde.
Fazem-nos pensar mais rápido e correr mais depressa.
Eu não sei como são as vitaminas porque nunca as vi com a lupa
mas penso que devem ser verdes. Porque o verde faz-me
pensar em saúde e em coisas parecidas.
Os cactos também são verdes. Mas não têm nada a ver com as vitaminas.



(anti-lupa)
Às vezes a lupa pode complicar em vez de ajudar.
Como quando estamos muito perto de uma coisa e a queremos ver toda
mas não conseguimos. Aí a lupa só vai piorar a situação.
Por isso eu penso que também é bom termos uma anti-lupa
que nos faça ver as coisas diminuídas de vez em quando.
Assim podemos ver as coisas grandes no seu todo.
Às vezes as pessoas gostam de estar muito perto das coisas
para lhes tocar e dizer
”eu toco a coisa logo a compreendo”.
E aí vem a anti-lupa dizer que não compreendem a coisa
porque não a vêem no seu todo.
Muitas pessoas também não gostam da anti-lupa por isso.



(a lupa, V)
A lupa vê coisas que mais ninguém vê. Como a visão raio-X
do super-homem. Só que não é preciso ser o super-homem para se ter uma lupa.
Mas às vezes as pessoas sentem-se super importantes
só por terem uma lupa, e dão-lhe demasiado valor.
Como as pessoas que fazem colecção de lupas em casa,
todas organizadas em caixinhas de madeira, forradas no interior com veludo,
numa sala própria, para poderem exibir aos amigos que vão lá a casa e então dizerem
“esta comprei numa feira de lupas em Londres; é um excelente espécime.”
Mas esquecem-se que o verdadeiro objecto não é a lupa,
mas o que vemos a partir dela.



(a lupa, VI)
Existe ainda outro tipo de pessoas que falam mal da lupa.
Dizem que a lupa não é um auxiliar da nossa visão
mas sim algo que deturpa a natureza das coisas.
Então eu penso que o nosso sentido de visão já deturpa as coisas
como elas são. Por isso não atribuo culpas à lupa.
A lupa vê muitas coisas que as pessoas não gostam de ver
como os piolhos na cabeça ou porcarias no nariz e nos dentes.
As pessoas só gostam de usar lupa para ver flores e outras coisas que cheiram bem.
Mas esquecem-se que a lupa vê tudo.


FF

Saturday, March 19, 2005

DRAMATISMOS

Não consigo mais escrever!
Porque reneguei a paixão da minha vida!
Não consigo mais me conter!
Solidão… por ela vencida!

Assusto-me a cada momento
(ah! penoso sofrimento)!
Tudo se desmorona ao segundo,
lá no fundo do meu mundo.

Por favor que seja fantasia…
Pois não suporto mais essa agonia!
Ah!...que merda!

P’ó caralho com essas rimas,
que me prendem ao papel,
p’ó caralho com essa vida
que prende a esta terra,
p’ó caralho tudo…
tudo… p’ó ca-ra-lho!!
Que eu vivo por acaso!
Tudo é um acaso,
que me prende a esta vida!!

Eh! eh! eh! eh! eh! eh! eh!
Eh! eh! eh! eh! eh! eh! eh!

Viva! a liberdade de escrita.
Viva! a vontade que tive de mandar tudo p’ó caralho.
Viva! a vida que deixei de viver.
Viva! a vida que finjo viver,
Viva! viva! viva! viva! viva!

VIVA! A PAIXÃO DA MINHA VIDA!
Viva! a solidão que me venceu!
Viva! o susto de cada momento.
Viva! penoso sofrimento!
Viva! o segundo…
Viva! aos fundos dos mundos do meu nada!
Viva! à possível fantasia!
Viva! à agonia!
Viva! à vida!

Apetece-me ir gritar para a rua.
Apetece-me ver a Lua.
Apetece que me digam a verdade, nua e crua.


Armando Luís

cá tá

Na necessidade de mostrar o que fazemos, criou-se este blogue bacano.